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Um terço das escolas segregam alunos de origem imigrante

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Num país que viu a sua população imigrante aumentar consideravelmente na última década, as escolas foram também acolhendo essa diversificação. A questão que um grupo de investigadores da Universidade Nova de Lisboa colocou e quis responder com uma análise a milhares de dados sobre os estudantes que frequentam o sistema de ensino público é se o fizeram integrando ou discriminando. E o que concluíram é que, se na maioria dos casos não são visíveis práticas de segregação na constituição de turmas com base na origem imigrante dos alunos — uma das variáveis que quantificaram no estudo a que o Expresso teve acesso e que será publicamente apresentado e discutido na próxima quinta-feira —, existem concelhos e escolas onde se verifica claramente que a tendência é juntar alunos em que eles próprios, o pai e/ou mãe têm naturalidade estrangeira.

O estudo realizado por investigadores das faculdades de Economia (Nova SBE) e de Ciências Sociais e Humana (FCSH) da Universidade Nova de Lisboa e promovido pela associação EPIS — Empresários pela Inclusão Social, começou por olhar para a distribuição dos alunos de escolas do 3º ciclo (7º ao 9º) que têm no seu registo escolar a indicação de naturalidade estrangeira para calcular o índice de segregação por concelho e por escola. No primeiro caso, trata-se de ver se a distribuição de alunos de origem imigrante entre escolas de um mesmo município é uniforme, explica Luís Catela Nunes, professor da Nova SBE e um dos coordenadores do estudo. Foram analisados dados para 93 concelhos (onde os dados permitiam tirar conclusões) e concluiu-se que em um quarto (23%) havia valores “elevados de segregação”, sobretudo na Região Metropolitana de Lisboa, mas também em zonas dispersas pelo país, como Fafe, Silves, Castelo Branco ou Santiago do Cacém.

A nível local, estes fenómenos podem, no entanto, ser a expressão da concentração de determinadas populações em zonas delimitadas. Já que no que respeita à segregação por escola, verificou-se que em um terço (num universo de 404 estabelecimentos de ensino) havia turmas com sobrerrepresentação de outras naturalidades. O fenómeno volta a ser mais frequente na região metropolitana de Lisboa. “Esta concentração de alunos não nativos na mesma turma não é fruto do acaso ou da organização territorial, mas de decisões tomadas a nível de escola. Este estudo não vai à procura das razões por trás destas práticas, mas constata uma realidade que existe em alguns locais e que deve ser combatida pois é contrária à inclusão. Ainda por cima, a sua resolução não custa dinheiro, depende de organização e liderança da escola”, sublinha Diogo Simões Pereira, o diretor-geral da EPIS, associação que apoia projetos de combate ao insucesso.

Isolando as escolas com níveis de segregação mais altos, a média do índice é 0,45, com um valor máximo de 0,56 (0 corresponde a ausência de segregação e 1 a segregação total). Ou seja, metade dos alunos de origem imigrante dessas escolas teriam de ser realocados para que não houvesse segregação. No trabalho não se identificam os casos, embora estes dados sejam acessíveis ao Ministério. Os autores também concluíram que não existe relação entre haver mais população imigrante numa escola ou concelho e práticas de segregação mais vincadas.

NÃO RECUPERAR NA ESCOLA

“Olhando para os dados desta investigação, mas também de um estudo anterior que revelou que a maior segregação dentro das escolas ocorria por via do desempenho escolar e não tanto pelo rendimento ou naturalidade, o que parece acontecer nestas escolas é que alunos com mais dificuldades são colocados ao lado de outros com iguais problemas, perpetuando a segregação”, nota Luís Catela.

E o que este estudo também mostra de forma muito clara são as diferenças de resultados escolares entre alunos de origem imigrante comparativamente com os nativos. Os alunos naturais de PALOP têm em média menos 20 pontos no exame de Matemática do 9º ano (escala de 0 a 100) e menos 6 a Português comparando com os naturais de Portugal. Em relação aos naturais do Brasil, as diferenças são de 16 e 4 pontos, respetivamente. Se os resultados forem comparados com os naturais da União Europeia ou do Leste europeu praticamente não existem diferenças. A questão que se levanta é saber se não são as condições socioeconómicas, que são um forte preditor do sucesso, a determinar estas diferenças. Os investigadores compararam então os resultados entre alunos nativos e não nativos com as mesmas condições socioeconómicas e as diferenças diminuíram um pouco, mas mantiveram-se.

Outra análise feita olhou para o percurso escolar ao longo de 11 anos de um grupo de 98 mil alunos que entraram no 1º ano em 2006/07. As diferenças começam logo no 1º ciclo: 87% dos alunos de naturalidade portuguesa completaram os primeiros quatro anos da escola sem chumbar, o mesmo acontecendo com alunos da UE e Europa de Leste. Já estudantes de naturalidade brasileira e dos PALOP apresentam taxas inferiores de sucesso, com 82% e 70%, respetivamente. Passados dez anos da primeira inscrição, os valores afastam-se ainda mais, com o peso das retenções a acentuar-se: 65% dos alunos de naturalidade portuguesa estavam inscritos no 10º ano, mas apenas 47% dos naturais do Brasil e 35% dos naturais de PALOP. Já os de origem imigrante de Leste e da Europa continuam com percentagens muito semelhantes aos naturais de Portugal. “Muitos alunos com origem imigrante não alteram os seus resultados, agravam nalguns casos, pelo que podemos concluir que a escola não está a ser inclusiva para estes jovens que precisavam de outras estratégias pedagógicas para a sua recuperação”, defende a investigadora da FCSH e coordenadora do estudo Sílvia Almeida.