Uma vez mais foram divulgados os rankings dos estabelecimentos de ensino. O tema continua a dividir opiniões
SIM
Ensinou-me a praxis que quase nunca é possível dividir o mundo entre um “sim” e um “não”; contudo, quando falamos de rankings das escolas, se me exigissem uma visão maniqueísta, rapidamente responderia: “Sim, os rankings são importantes e a sociedade não deve abdicar deles.”
São importantes porque funcionam como indicadores e reguladores de um processo — ainda que inúmeras variáveis possam vir a deturpar essa leitura e a perceção da realidade —, nomeadamente o facto de incorrermos no erro de esquecermos que estes são a leitura feita pelos diversos órgãos de comunicação social sobre dados fornecidos pelo Ministério da Educação; daí que o modo como estes agrupam a informação acabe por ser preponderante na forma como a opinião pública (a maior parte das vezes pouco dotada de ferramentas para o efeito) a recebe e, nessa medida, haver o risco de poderem vir a ser meros instrumentos de propaganda de determinadas escolas públicas e privadas e extremamente injustos para os profissionais enquadrados pelos objetivos e metas estabelecidos nos projetos educativos de outras menos bem posicionadas.
Os rankings são pertinentes porque são uma ferramenta de reflexão para cada escola
Esta leitura injusta pode advir também de não se ter em conta que os dados resultam de diferentes realidades (quer seja o ensino público e o privado, quer sejam escolas públicas de diferentes contextos socioeconómicos) mas, quando analisados de forma correta (sem objetivos de puro marketing), os rankings permitem efetuar um diagnóstico às diferentes realidades e perceber de que forma se poderá atuar sobre as práticas para melhorar o sucesso educativo de uma escola. Comparando escolas com universos semelhantes nas suas variáveis e tipo, torna-se também possível verificar a importância das lideranças intermédias, a adequação do perfil do diretor àquele contexto e a sua capacidade para gerar espaços/projetos de valorização cultural, pois, apesar de cada escola ser um universo próprio que obedece ao pulsar da sua comunidade, no final terá de responder ao mesmo nível de exigência da avaliação externa e do futuro mercado de trabalho.
Os rankings são pertinentes porque são uma ferramenta de reflexão para cada escola e para o próprio sistema educativo, podendo funcionar para todos os agentes educativos como motivação para a melhoria dos resultados (se conseguirem colocar de lado a falácia de trabalhar apenas para os rankings — como é feito por determinadas escolas — e não para o tão apregoado desenvolvimento de competências que leva à capacidade de se mobilizar e aplicar conhecimentos em novas situações de aprendizagem).
Se, por um lado, os rankings revelam, muitas vezes, o fosso cada vez maior entre o topo e a base da pirâmide social, por outro dão a possibilidade às respetivas comunidades educativas de procurar as ferramentas que anularão as desigualdades de oportunidades, permitindo à escola pública continuar a constituir-se como o elevador social preconizado pela Lei de Bases do Sistema Educativo.
Professora do ensino básico e secundário, membro da Missão Escola Pública
NÃO
Assuma-se: os rankings servem para promover o ensino privado, escondendo as realidades em que os colégios e as escolas públicas desenvolvem a atividade. Os colégios escolhem os alunos, chegando a recusar aqueles que possam prejudicar o seu lugar no ranking; as escolas públicas, como é seu dever, abrem portas a todos, garantindo-lhes condições de sucesso que, em muitos casos, passam por evitar que abandonem a escola, conseguindo concluir a escolaridade obrigatória. Comparar a média obtida pelos alunos de colégios com a dos alunos de escolas públicas é batota, sendo lamentável ouvir governantes responsáveis afirmar que os rankings são uma mais-valia. Ademais, os dados divulgados não são transparentes, pois informações disponibilizadas sobre a origem dos alunos das escolas públicas são omitidas em relação aos dos colégios privados.
Há países que abandonaram este processo de mal comparar escolas, estigmatizando umas para promover outras. Um deles foi a Irlanda, onde o próprio Supremo Tribunal deu razão ao Ministério da Educação, que se recusava a entregar os resultados à comunicação social, por considerar que essa recusa era a decisão que melhor servia os interesses do sistema educativo irlandês.
Os rankings servem para promover o ensino privado
Quem se aproveita sempre dos rankings são os colégios privados, que não perdem tempo para se pôr em bicos de pés face às escolas públicas. Não sei se o colégio Efanor, o Nossa Senhora do Rosário ou qualquer um dos primeiros 43 da lista aceitariam inscrever filhos de imigrantes e refugiados, alunos de etnia cigana, alunos com necessidades específicas necessitando de medidas seletivas ou adicionais, entre outros, mesmo que fossem financiados integralmente pelo Estado. A escola pública aceita-os, como qualquer outro, e isso é uma lição de vida para todos. O certo é que os privados não perdem uma oportunidade para defender um sistema de financiamento da Educação que trate público e privado como se da mesma resposta se tratasse.
A nossa memória não é curta e mantém presente situações comprovadas de abuso quando, injustificadamente, eram celebrados contratos de associação com colégios, a ponto de até a troika, veja-se, ter criticado a opção.
O que deveria [pre]ocupar os governantes era:
— como reforçar os recursos das escolas públicas para que estas deem ainda mais e melhores respostas a todos os alunos, num tempo marcado pela diversidade;
— compreender os sucessivos estudos que confirmam que os alunos provenientes das escolas públicas obtêm melhores resultados no ensino superior do que os que estudaram em colégios privados;
— refletir sobre se interessa continuar a usar os rankings, estigmatizando escolas públicas em que é desenvolvido um exigente trabalho com os alunos;
— saber se interessa um sistema de avaliação externa de alunos assente em exames que o Governo pretende começar logo no 4º ano de escolaridade.
Educar é muito mais do que treinar alunos para fazer exames, avaliando escolas e professores pela média dos resultados obtidos pelos alunos. É tempo de parar com a demagogia e a mistificação!
Professor, secretário-geral da FENPROF