Consultando o Diário da República nº 235 de 6 de Dezembro de 2019, contendo a lista de aposentações na Administração Pública a partir de Janeiro de 2020, encontramos 8 educadoras de infância e 93 professore(a)s da rede pública de ensino. Há pelo menos um caso em que a aposentação será inferior a 500 euros mensais brutos e alguns será menos de 1000 euros ou um valor pouco superior. Claro que haverá quem ache que “num país pobre como o nosso” estes serão valores normais. Haverá mesmo quem ache que quem se consegue aposentar, ao fim do tempo legal para o fazer, após 40 anos de serviço, com mais de 2500 euros é alguém “privilegiado”.
Foi nesse tipo de mesquinhez, de aposta na inveja alheia, no nivelamento pela mediocridade, que o poder político se procurou apoiar para desenvolver uma política de recursos humanos na Educação que tornou insustentável a permanência para muitos profissionais que, exactamente por tentarem dar o seu melhor e não serem reconhecidos, preferiram partir. Política essa que, aliada a uma contínua desvalorização do trabalho docente perante a opinião pública e a opções muito discutíveis ao nível do recrutamento de novos docentes para os quadros – e não apenas para um precariado que trabalha em condições piores do que as que enfrentei quando leccionei pela primeira vez há já muitas luas e sóis – conduziu ao actual duplo fenómeno de envelhecimento do corpo docente das escolas com as naturais consequências de desgaste na saúde e à falta de candidatos a substituir quem coloca baixa médica em zonas onde o que se ganha mal chega para o que se gasta em deslocações.
As salas de professores ficaram mais pobres de muitos dos seus melhores profissionais, quantas vezes por esgotamento psicológico ou físico, enquanto cada vez mais alunos passaram a não ter aulas por períodos mais prolongados numa, duas, três disciplinas.
Por considerar inútil argumentar com quem foi agente ou cúmplice por omissão no agravamento desta situação, já pouco me apetece escrever sobre as causas e responsáveis pela situação que se vive. Prefiro antes deixar uma palavra de imensa compreensão em relação a muitos dos que partem como consequência do seu desânimo.
Porque eu compreendo quem parte, sabendo que não é uma desistência ou rendição, mas apenas a percepção de ser insuportável continuar nas condições que foram sendo criadas e nunca revertidas no essencial ao longo dos últimos 15 anos. Porque a partir de dado momento o “sistema” traiu as suas expectativas com argumentos falseados. Um sistema que não podemos já limitar apenas a este ou aquele mandato. Porque todos, sem excepção quiseram sempre mais, nada dando em troca ou dando-o apenas a pequenos grupos escolhidos pela sua postura “colaborativa” com o poder. Porque nem tudo é culpa do “sistema” ou da super-estrutura política, havendo muitas outras responsabilidades à escala micro, nomeadamente da parte de quem até gosta de ver partir, em jeito de selecção natural à sua medida, quem acha mais “fraco”. Quem sente que assim “sobe um lugar” na escala dos (de)méritos e vê alguém sair-lhe da frente.
Assim como não estão livres de responsabilidades, aquelas luminárias que argumentam que os professores estão demasiado “amargurados” e que as suas “frustrações” não são razão para não colaborarem em mais uma voltinha de “inovação”. Em regra, é gente que enche a boca com “utopias”, mas que não perde ocasião para ser presidente disto ou directora daquilo. Porque não há nada como mandar as tropas para a frente de batalha, para serem dizimadas, à maneira das tácticas militares sacrificiais dos generais de rectaguarda da Grande Guerra de 14-18. Gente que leva a vida em corredores, gabinetes e a debitar a mesma conversa durante décadas ou quem passa os seus dias bem longe dos alunos. Esses, infelizmente, ficam e raramente partem por vontade própria, pois o quotidiano pesa-lhes pouco.
Desses não sinto falta.