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Opinião: O Estado na Educação – por Paulo Simões Lopes

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 “…são os docentes que estão a contrariar o desmoronamento do edifício escolar, com custos pessoais enormes, ademais associados à Síndrome de Burnout…”

O Conselho Nacional de Educação apresentou no passado mês, mais um Relatório, desta vez sobre o Estado da Educação 2016. Um ponto que chamou a atenção da opinião pública foi o facto da descida da taxa de retenção e desistência, 14%, continuar acima da média dos países da UE28 ( 11%). Não podemos descurar o enorme esforço feito na área e o surpreendente resultado (em 1992, esta taxa rondava os 50%) mas é óbvio que ainda há um longo caminho a percorrer se compararmos com os 2,8% na Croácia.

Também devido a este indicador, a presidente do CNE criticou a cultura de retenção ainda predominante em algumas das escolas, muitas vezes funcionando como um acelerador de uma espiral invertida, provocando a estigmatização e potenciando ainda mais a retenção. Como assinalou no Relatório, nos desafios a enfrentar: “A prevalência excessiva da metodologia expositiva na sala de aula será também um aspeto a ter em conta entre os fatores de explicação da elevada taxa de insucesso escolar em Portugal”.

Sobre esta questão, quando interpelado sobre a recomendação do Relatório, o Ministro da Educação respondeu que esses dados diriam respeito ao ano letivo 2015-2016, cujo início “foi ainda da responsabilidade do anterior Governo”, tendo ainda declarado que “tivemos oportunidade de, sabendo nós como o estado da educação se apresentava nesse ano letivo, poder desenvolver novas políticas públicas para dar resposta” ao que o ministro classificou como “estaticidade das salas de aula”.

Ora, a questão da “metodologia expositiva”, apesar de constar em 3 páginas do Estado da Educação 2016, refere-se a um estudo de 2012, pelo que seria honesto se tivesse remetido a responsabilidade para os que governaram até 2012. Mas, se não leu o relatório, não o poderia ter feito. E se as respostas para a “estaticidade das salas de aula” são a “flexibilização e a autonomia curricular”, isso não implica que o ensino passe a ser menos expositivo.

Para o ser, terá de mudar o atual paradigma educacional de modo a despertar a curiosidade do aluno ao ponto de lhe possibilitar a resolução de problemas por diferentes caminhos (aprendizagem autónoma), como faz a metodologia de aprendizagens baseadas em problemas (ABP ou Inquiry-Based Learning). “Infelizmente”, isso obrigaria alunos a serem construtores do conhecimento e docentes a serem facilitadores e não transmissores desse conhecimento. Da mesma forma que não entendo que as aulas dadas (método expositivo), tenham de se sobrepor às construídas (método construtivista), também não percebo porque é que a aquisição de conhecimento tem que se sobrepor ao desenvolvimento de competências.

Mais preocupante, foi o ministro ter sugerido que desconhece os dados referidos no Relatório sobre a “metodologia expositiva”, apesar de publicitados pelo projeto de investigação aQeduto, baseado no TALIS2012, um inquérito da OCDE sobre Ensino e Aprendizagem (Teacher and Learning International Survey), que inclui a visão dos docentes, tendo merecido em 2016, o título curioso do DN de “Envelhecidos e desiludidos”.

O estudo “Q10” do aQeduto, alerta para problemas raramente discutidos, mas importantes no edifício escolar, como o facto da indisciplina em sala de aula, em Portugal, aumentar com a idade dos professores, apesar de sabermos que a experiência dos docentes contribui para os índices de disciplina. Esta é uma questão nuclear a que urge socorrer, para a qual não basta a retórica nem a utilização populista do chavão da “defesa da escola pública”.

Não tenhamos dúvidas, são os docentes que estão a contrariar o desmoronamento do edifício escolar, com custos pessoais enormes, ademais associados à Síndrome de Burnout, que já afeta cerca de um terço dos docentes do ensino pré-universitário, conforme inquérito do ISPA apresentado em fevereiro de 2016, pela FENPROF, numa conferência na Assembleia da República.
Mas será que é este stress ou burnout que está a alastrar e a condicionar a ação governativa, impedindo-a de melhorar o Estado da Educação? Por estas e por outras declarações comuns à classe política, diria que é a “Síndrome de Retórica”, replicada como as Matrioskas, que está a dominar a ação do Estado na Educação.

Fonte: http://www.asbeiras.pt