Em conferência de imprensa (13/out), realizada na sua sede, a Fenprof apresentou as conclusões da sua análise do orçamento de Estado para 2024 (OE2024). Concluiu que esta é mais uma oportunidade perdida, que apenas confirma que a Educação não é prioridade para o governo e a sua maioria absoluta.
Ponto prévio
O ministro da Educação remeteu para ministro das Finanças o anúncio das novidades da Educação, no Orçamento de Estado para 2024 (OE2024). O ministro das Finanças, em hora e meia de apresentação do OE2024, foi poupado em relação à Educação, pois nem uma palavra gastou.
Em relação ao tempo de serviço dos docentes, no primeiro dia da Semana Europeia dos Professores, o primeiro-ministro declarou que isso estava fora de hipótese. Em 12 de outubro, o ministro das Finanças disse que o governo não cederia ao poder vocal das organizações sindicais de docentes. E em 24 de outubro, os educadores e professores levantarão a voz no Ministério das Finanças para que o Medina oiça o som e perceba o tom das reivindicações dos docentes.
Sobre o orçamento para a Educação em 2024: A Educação em serviços mínimos
Já se tornou hábito: a proposta de Orçamento do Estado para 2024 limita-se a garantir serviços mínimos na Educação, não investindo, como deveria, num setor que os governantes gostam tanto de afirmar como determinante para o progresso e desenvolvimento do país, como de adiar o investimento que era necessário.
Valor do OE2024 para a Educação, considerado na sua relação com o Produto Interno Bruto (PIB), volta a cair
As organizações internacionais que atuam na área da Educação recomendam que as verbas para a Educação sejam da ordem dos 6% do PIB. Se tivermos em conta o valor do PIB em 2022 (242,3 mil milhões de euros), a sua evolução até 2024, de acordo com as projeções do governo (2,2% em 2023 e 1,5% em 2024), no ano de 2024 o valor do PIB em Portugal atingirá € 254 050 338,5. Face a este valor, os 7320, 6 milhões de euros previstos para a Educação em 2024 representarão 2,9% do PIB. Ainda que se juntasse toda a despesa prevista, da educação pré-escolar ao ensino superior, não se atingiam os 4,3% do PIB.
Podem o ministro da Educação e a sua congénere do Ensino Superior e Ciência afirmar que aumenta o valor da verba atribuída. Não esclarecem é qual a razão por que ao aumento da riqueza produzida em Portugal não corresponde um acréscimo de financiamento para estas duas áreas, no mínimo proporcional.
Portugal muito abaixo do nível de financiamento médio dos países da OCDE
Quando, há um ano, se discutia o OE2023 ficou a saber-se que o Estado Português, tendo em conta a Paridade de Poder de Compra para o PIB, gastava, por aluno do ensino básico e secundário, menos 1500 euros do que o valor médio dentro da OCDE. Em 12 de setembro, a OCDE confirmou este nível de subfinanciamento, revelando que o financiamento em Portugal, por estudante, se mantém 14% abaixo daquele valor médio.
O comprovado subfinanciamento da Educação em Portugal não levou o governo a inverter tendência
O crescimento do valor orçamentado para 2024 comparado com o do estimado para 2023 é de 5,7%. Tal aumento não representa um crescimento real se tivermos em conta que a inflação prevista até final deste ano, segundo o governo, é de 5,3%, valor que até final do ano vai, certamente, ser revisto em alta. Se se considerar que em 2022 a inflação atingiu 8,1%, mas o orçamento da Educação sofreu uma redução de 7,6% (na altura, justificado com a transferência de competências para os municípios), facilmente se conclui que a Educação e a Escola Pública vivem no limiar da pobreza, contando os trocos no dia a dia. Ou seja, o orçamento para a Educação em Portugal continua a ser um orçamento de gestão corrente e não de investimento.
Vencimento real líquido dos educadores e dos professores é cada vez reduzido
O vencimento real dos docentes é cada vez mais curto. De acordo com estudo elaborado pelo economista Eugénio Rosa, utilizando os dados divulgados pela DGAEP referentes às remunerações base média dos docentes, percebe-se a perda elevada do poder de compra das suas remunerações líquidas entre 1 de janeiro de 2022 e abril de 2023. Sem contar com o roubo de tempo de serviço que continua a ser feito, os educadores e professores dos ensinos básico e secundário, neste período, viram o seu vencimento real líquido reduzir-se em 13,3% (os docentes do ensino politécnico e do universitário também têm fortes quebras, respetivamente de 12% e 9%). É com o vencimento líquido que todos os portugueses pagam todas as despesas.
Prevendo o governo uma inflação de 3,3% para 2024 e a atualização do vencimento em 3%, significa que não haverá recuperação do poder de compra e, pelo contrário, manter-se-á o rumo de desvalorização salarial. O aumento da despesa com pessoal não se traduz na valorização das carreiras, designadamente por via da contagem do tempo de serviço que se mantém congelado. O aumento de 185,4 milhões de euros em pessoal, correspondendo a uma variação de 3,5%, no que aos docentes diz respeito, um pouco acima de 3% serão consignados à chamada atualização salarial que, mais uma vez, fica abaixo da inflação prevista.
Assim sendo, o posicionamento dos docentes contratados a termo em 3 índices remuneratórios (que se tornou obrigatório por diretiva comunitária que impede a sua discriminação salarial, como estava a acontecer); o ingresso nos quadros e correspondente reposicionamento na carreira de cerca de 8000 docentes por imposição da mesma diretiva que impede os estados de recorrerem abusivamente à contratação a termo; a criação de estágios remunerados, não tanto para valorizar a formação inicial de docentes, mas para mitigar o grave problema da falta de professores nas escolas… tudo isto vale, no máximo, 0,5%, ou seja, 26,5 milhões de euros. Como se compreende, 26,5 milhões de euros não são suficientes para as medidas referidas, pelo que serão financiadas pela verba libertada pelas aposentações. Portanto, não há investimento na profissão docente, nem estratégia para a tornar atrativa. Na Educação, no tempo do digital, a gestão continua a ser de merceeiro.
No que à carreira diz respeito, a proposta de OE2024 não prevê recuperar um único dia dos 6 anos, 6 meses e 23 dias que continuam congelados, não aponta para a eliminação das vagas aos 5.º e 7.º escalões e não revoga as quotas na avaliação do desempenho.
O impacto do chamado “acelerador”, na verdade um “aspirador” de tempo de serviço, será reduzido, pois a grande maioria dos docentes abrangidos por este quadro legal já obteriam vaga, sendo poucos os que progredirão por via das eventuais vagas supranumerárias.
Apoio às rendas? Que apoios? Ver para crer!
No Relatório do OE2024 pode ler-se que serão criados apoios para rendas de professores colocados a mais de 70Km das residências, desde que as mesmas correspondam a taxas de esforço superiores a 35%. Não refere, porém, qual o tipo de apoio.
Ver para crer, porquê? Porque:
Em 2020, a promessa era a de os professores mais velhos e com mais anos de serviço que se encontravam em regime de monodocência (educadores de infância e professores do 1.º CEB) passarem a desempenhar outras funções que não as letivas. Não cumpriram!
Ainda em 2020, era a criação de incentivos à aposta na carreira em áreas do país e grupos de recrutamento onde a oferta de profissionais possa revelar-se escassa. Não cumpriram!
Em 2021 era a implementação de um sistema de intervenção precoce e o alargamento da rede pública de educação pré-escolar. Nem sequer o grupo de recrutamento de Intervenção Precoce foi criado, quanto mais alargarem a rede pública de educação pré-escolar! Não cumpriram!
Também em 2021, surgiam promessas como as de avaliar e melhorar o modelo de AEC, rejuvenescer a profissão docente, permitir a conciliação entre a vida profissional e familiar e, ainda, a remoção do amianto das escolas. Nada disto foi feito!
Em 2022 e 2023 o governo não prometeu nada, talvez para não passar mais vergonhas pela sua inépcia. Qual a razão por que se deve acreditar no que promete agora? Por não acreditar na iniciativa do governo, a Fenprof vai apresentar ao ME uma proposta concreta de incentivos e apoios aos docentes colocados em áreas carenciadas.