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O que falta fazer para garantir que não vão faltar professores nas escolas?

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Se nas eleições de 10 de março apenas estivesse em causa a resolução do problema da falta de professores e atratividade da carreira docente, quase não haveria muito a discutir, tal o consenso gerado entre os partidos, quer sobre o diagnóstico – há um problema de falta de docentes e de valorização da profissão –, quer sobre as medidas a tomar que, nalguns casos, apenas diferem nos detalhes de implementação.

Veja-se o caso da devolução integral do tempo de serviço congelado, que ainda não há muito tempo quase esteve na origem de uma crise política e que agora é defendida por todos os partidos, incluindo PS e PSD, que antes votaram contra ou não a viabilizaram. Agora, o único aspeto que divide os partidos é o tempo que demorará essa reposição: de forma mais rápida, ou no prazo de uma legislatura.

Já a questão da eliminação de quotas na avaliação de desempenho e de limites de vagas para a progressão na carreira, outra das reivindicações mais ouvidas entre os professores, não constam do programa eleitoral dos maiores partidos, ainda que sejam defendidas por Bloco de Esquerda, PCP, Livre, PAN e Chega.

Mas se a contagem do tempo de serviço congelado (seis anos e seis meses que não foram considerados para a progressão na carreira) é agora consensual e pode fazer diminuir os níveis de contestação e desmotivação de quem foi mais afetado, não resolve o problema da escassez de professores, já que não melhora as condições de quem ingressa na carreira.

Até 2030, será preciso recrutar uma média de 3500 professores ao ano, segundo um estudo pedido pelo Ministério da Educação a investigadores da Nova SBE. O problema é que os dados dos últimos anos indicam que o número de diplomados em cursos que conferem habilitação para a docência tem ficado sempre aquém das necessidades.

DIPLOMADOS EM MESTRADOS PARA A DOCÊNCIA

NECESSIDADES DE NOVAS CONTRATAÇÕES PARA O ENSINO

A “EMERGÊNCIA” DE ATRAIR NOVOS PROFESSORES

Perante este desajuste, é preciso fazer mais, concordam os partidos. Valorizar a carreira, dignificar, dar melhores condições, desburocratizar, são palavras que se repetem em todos os programas eleitorais. “O problema da falta de professores é grave e agrava-se de ano para ano”, avalia Carlinda Leite, professora jubilada da Universidade do Porto e coordenadora do grupo de trabalho criado pelo Ministério com a missão de apresentar propostas para a revisão do diploma que regula as habilitações para a docência.

Mas a preocupação dá lugar a alguma esperança quando vê “propostas positivas nos programas de quase todos os partidos” no sentido de tornar a carreira mais atraente e de reduzir a precariedade. “Agora, não basta propor, é preciso concretizar”, avisa Carlina Leite, pedindo ao futuro ministro da Educação que tenha a capacidade de olhar para as propostas que vão nesse sentido e de por em prática as melhores soluções. Dá o exemplo do programa do PAN, o último a ser apresentado, que apresenta uma série de medidas em torno da “sustentabilidade” que “podiam e deviam ser mobilizadas pelos partidos” que venham a assumir a governação.

Uma das ideias que a investigadora gostava de ver rapidamente posta em prática tem que ver com uma melhoria dos salários de educadores e professores, pelo menos no início da carreira. O PS fala em “reduzir o hiato entre os índices remuneratórios da base da carreira docente e os índices mais altos”. No caso da AD, coligação liderada pelo PSD, há mesmo um subcapítulo dedicado a “um programa de emergência para atrair novos professores”, em que se prevê “rever o salário em início de carreira e rever os restantes índices e escalões, no sentido de simplificar o sistema remuneratório” e “promover o regresso ao ensino dos professores que tenham saído da profissão, através de mecanismos de bonificação de reposicionamento da carreira”.

VENCIMENTOS BRUTOS* DOS PROFESSORES DO ENSINO NÃO SUPERIOR NOS DOIS PRIMEIROS E DOIS ÚLTIMOS ESCALÕES

 

O PCP e o Livre abordam especificamente a questão da aposentação, com os comunistas a defenderem um regime específico para os professores, que atenda às características das atividades que desenvolvem e o “desgaste que delas decorre”, e o partido liderado por Rui Tavares a propor que todos os docentes tenham direito a aposentar-se, com pensão por inteiro, aos 36 anos de serviço.

Outra das dificuldades que têm levado a que a falta de professores se faça sentir em regiões como Lisboa e Algarve, muito pressionadas pelos custos da habitação, são também abordadas nos programas eleitorais. “Os apoios que foram anunciados no ano passado são muito incipientes. É urgente tomar mais medidas, sabendo que as regiões e escolas com mais dificuldades estão identificadas”, defende a professora da Universidade do Porto. Dedução de despesas de alojamento em sede de IRS, compensações e incentivos são algumas das medidas propostas pelos partidos.

AUTONOMIA PARA CONTRATAR

Sobre os mecanismos de contratação e recrutamento de professores, apenas a Iniciativa Liberal propõe uma alteração profunda no sistema “demasiado centralizado, focado em critérios muito limitados (como nota do curso e anos de experiência) e muito demorado”. O partido de Rui Rocha defende uma muito maior autonomia das escolas na escolha dos recursos humanos “que melhor se ajustam ao projeto educativo” de cada uma.

No entanto, o concurso centralizado no ME e o respeito pela lista nacional de graduação têm sido pedras basilares do sistema de recrutamento de professores, defendidas com unhas e dentes pelos sindicatos. Quando o ainda ministro da Educação falou na existência de um sistema misto, com as escolas a terem capacidade de escolher até 30% dos seus professores, de acordo com critério próprios, a oposição foi imediata e a “opinião” nem chegou a proposta.

Expresso