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Notas sobem em ano de pandemia

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No ano letivo mais complicado de sempre, as notas dos alunos nos exames nacionais bateram todos os recordes e tudo indica que também as classificações atribuídas pelos professores tenham subido. Não porque o ensino à distância a que 1,5 milhões de crianças e jovens tiveram de se habituar de um momento para o outro, mesmo os que não tinham condições para o realizar, tenha resultado particularmente bem. Mas em ano de adaptações forçadas, várias regras foram alteradas, incluindo o próprio modelo dos exames. Por isso, o ranking das escolas de 2020 tem de ser visto ainda com mais cautelas e ressalvas, impedindo sobretudo a comparação com anos anteriores.

Dito isto, os dados fornecidos pelo Ministério da Educação continuam a permitir várias leituras que não se limitam à mera ordenação das escolas pelas médias obtidas nos exames. Era assim há 20 anos, quando o Ministério da Educação teve de divulgar pela primeira vez, por determinação da Comissão de Acesso aos Dados da Administração, as classificações por estabelecimento de ensino. E foi assim durante vários anos, sem nenhum outro indicador de contextualização.

Desde 2012, no entanto, começaram a ser divulgados outros elementos que permitem perceber as dificuldades e facilidades dos alunos que chegam a cada escola e a mais-valia que cada uma acrescenta ou não. Isto para o universo dos estabelecimentos públicos.

Os rankings permitem por isso assinalar o mérito do Colégio Nossa Senhora do Rosário, no Porto, que ano após anos apresenta as médias mais altas nos exames do secundário, como o da Infanta Dona Maria, em Coimbra, a escola pública que em 2019/20 apresentou o resultado mais alto.

Mas terá também de ser reconhecido, e ainda mais, o esforço das escolas onde os percursos diretos de sucesso (sem chumbos) dos seus alunos, sobretudo dos mais vulneráveis e que recebem o apoio da ação social escolar, são mais frequentes do que a média nacional. É o caso da Básica e Secundária de Airães, por exemplo, onde se tenta que os filhos vão bem mais longe nos estudos do que aconteceu com os seus pais (ver texto Liderança, Ambição, Exigência).

Informações como as habilitações dos pais, a percentagem de beneficiários da ação social escolar, a comparação de percursos entre alunos com pontos de partida semelhantes podem ser consultadas através destes rankings, dos textos de análise que os acompanham, no site do Expresso, bem como no portal Infoescolas, disponibilizado pelo Ministério da Educação. A fotografia nunca é total, mas não deixa de traçar um retrato de um sistema muito diverso e onde situações de grandes dificuldades e falta de perspetiva se repetem ano após ano.

É também isto que mostram 20 anos de rankings e que na opinião da professora da Nova SBE Ana Balcão Reis deveriam suscitar uma intervenção do Ministério. A investigação que conduziu em 2015 com outros professores da Faculdade de Economia da Nova mostrou como mais do que as privadas (que acabam por fechar se têm muito maus resultados), há escolas públicas que se repetem nos lugares inferiores dos rankings. “Valeria a pena avaliar se há algo em concreto que não está a correr bem aí ou se as dificuldades resultam do contexto em que a escola se insere e mereceria um reforço de meios. Há países em que, nestas situações, se decidiu redistribuir os estudantes por outros estabelecimentos de ensino. Também seria possível permitir aos alunos destas escolas escolherem outras que não da sua área de residência”, sugere.

Do lado positivo, Ana Balcão Reis salienta a “democratização no acesso à informação” e o maior “diálogo e atenção que passou a ver dentro da escola e entre esta e os encarregados de educação” em torno das classificações. “Os exames não são o único objetivo da escola. Mas são uma parte importante e têm a vantagem de ser um dado objetivo e mensurável.”

A FALTA QUE A ESCOLA FEZ

A pandemia que se abateu sobre o mundo em 2020 veio no entanto condicionar todo o ensino, com meses de aulas à distância e um regresso imprevisto da telescola. Com os alunos fora das escolas, as regras do jogo tiveram de ser alteradas. A tutela cancelou as provas do 9º ano (também em 2021) e determinou que os exames do secundário só seriam realizados para efeitos de acesso ao ensino superior, deixando de contar para a nota das várias disciplinas. Além disso, o próprio modelo de prova foi alterado, permitindo que os estudantes errassem ou não respondessem a algumas questões sem penalização.

O exame de Matemática, por exemplo, foi realizado apenas pelos candidatos aos cursos que o tinham como prova de ingresso e que estarão mais à vontade com a disciplina. E os alunos mais fracos que não concorriam ao superior não tiveram de realizar exames. Resultado: as médias subiram até três valores (numa escala de 0 a 20) a várias disciplinas. E dispararam as notas de 19 e 20. No exame de Matemática, as classificações mais atribuídas foram 17 e 19. No ano passado, tinham sido as de 8 e 10. Mas se as notas subiram, não será por isso que 2019/20 será recordado. O mais provável é entrar para a história como o ano em que a escola e os professores mais saudades deixaram. Aos alunos e aos pais.