Já tudo foi escrito e reescrito, lido e treslido, mas convém, de qualquer modo, sumariar o assunto de modo muito breve, mesmo se pode parecer chato a quem o conhece ou a quem insiste em não o querer conhecer.
Em finais de Agosto de 2005, como outras, a carreira docente sofreu um congelamento das progressões que durou até final de 2007 e foi retomado durante os anos de 2011 a 2017. Os “famosos”, 9 anos, 4 meses e 2 dias. O que nem sempre é lembrado é que em 2007 foi aprovado unilateralmente um novo estatuto que reformulou a carreira, inserindo-lhe, de início, uma segmentação horizontal (a questão dos titulares), mas também dois novos escalões na fase intermédia da carreira, acrescentando 6 anos à progressão. Isto significa que aos professores atingidos por essa medida, no início de 2018, o impacto das medidas da década anterior equivalia a um retrocesso superior a 15 anos na referida progressão, algo que nem sempre é tido em conta. Porque há quem tenha sido obrigado a regredir 2 ou 3 escalões. Falo em todos os que, por exemplo, como eu, passaram do anterior 7.º para o actual 4.º escalão e assim ficaram muitos anos. Ou mesmo mais de uma década.Quando se deu a recuperação parcial do tempo congelado, equitativa em relação a outras carreiras sob falsos pretextos, para muita gente, aos 6 anos, 6 meses e 23 dias em falta, acresciam os tais 6 anos que tinha sido necessidade cumprir para atingir o mesmo patamar que antes era acessível. Para além da questão das quotas na transição para os novos 5.º e 7.º escalão.
Este facto não é estranho ao modo como agora se encara a anunciada recuperação faseada do tempo congelado porque, na verdade, não se trata de ver um copo meio cheio ou meio vazio. Para a larga maioria das pessoas, o copo está, à partida, meio vazio. E há quem tenha saído da carreira, por idade ou opção, com ele completamente vazio. E nem sempre quem chegou mais tarde e entrou na carreira já com ela com a estrutura em vigor compreende ou sequer conhece o contexto de quem teve outro percurso. Porque sente que vai recuperar todo o tempo que lhe foi congelado e ficar, aparentemente, sem quotas para a progressão. E estranha que exista quem não se entusiasme sem reservas.
Para não recuarmos muito, que a memória é qualidade em acelerada erosão e a padecer de apagões selectivos, relembre-se que a geração de professores a que pertenço, que em 2007 estava até ao tal patamar do 7.º escalão da carreira anterior, levou com um alongamento de 6 anos, para além dos dois congelamentos. Por questões de idade, muitas pessoas que viram o seu contrato original adulterado, só agora estão nos escalões a que deveriam ter chegado, ali por 2010 ou 2015. E prestes a aposentar-se sem forma de recuperarem qualquer dos 6 anos e meio de serviço. Sim, há quem já se tenha aposentado sem qualquer recuperação, mas em muitos casos foram pessoas que não levaram com os tais 6 anos adicionais de carreira.
Se todos ficam a perder, porque o tempo que não avançaram foi tempo em que as perdas materiais aconteceram, é capaz de ser justo reconhecer que há quem nunca conseguirá encher metade do copo, sequer. Porque foram duplamente prejudicados, não há a possibilidade de encararem o copo como meio cheio. E há quem não compreenda isso ou sequer conheça as razões.
Claro que a situação é neste momento muito mais favorável do que era o ano passado ou há 5 anos. É óbvio que, logo que o descongelamento aconteceu, deveriam ter sido tomadas medidas para não prolongar mais uma situação profundamente injusta, que só se manteve por manifesto capricho de um punhado de governantes – e seus prolongamentos mediáticos – que nunca perdoaram a contestação que lhes foi movida desde 2007.
É importante que muitas pessoas, que parecem ver só o copo a encher, entendam que os pontos de partida e chegada não são os mesmos. O copo nunca poderia ficar cheio, haveria sempre quem ficasse a perder, mas não venham dizer que ficará meio cheio para todos porque não é verdade.
Escreve sem aplicação do novo Acordo Ortográfico.