Ligou-me uma antiga professora de um dos meus filhos, explicadora, ansiosa e francamente a precisar de desabafar. Com ela, numa disciplina de 10º ano, ultra complexa, um dos meus filhos passou de 7 em outubro para 19 em janeiro, manteve-se entre o 17 e 19 até ao 12º e no exame nacional teve 17. Foi a melhor professora e mais exigente que ele teve na vida. Disse-lhe no primeiro dia de explicações, vais ter 60 exercícios por semana, se não os fizeres (e recebia muito bem) não te posso continuar a dar explicações.
Nunca foi muito simpática nem antipática comigo. Era dura. E distante, educada.
Agora na Universidade o meu filho voltou a ter 17 nessa cadeira, foi o melhor aluno no exame. A professora entretanto foi para um escola nova onde a direcção impôs que ela não pode dar menos de 8, escolha pública conhecida, tida como modelo; os pais fizeram várias queixas dela, para a direcção e para o Ministério, que ela dava más notas. Neste ano colocaram outros professores que davam 16, 17, 18 e os pais felizes, sem queixas. Vieram agora os exames dessas turmas e dezenas desses alunos que tiveram 16, 17 ao longo do ano tiveram negativas, alguns de 2, 3 valores.
Ela foi perseguida por dar notas verdadeiras.
O assédio das direcções, de pais e sobretudo de colegas, cobardes, é que o nos trouxe aqui, porque o problema não é que de cima cheguem ordens intoleráveis, o problemas é que os de baixo não se unem para se recusarem a cumpri-las. O assédio não se resolve só nem principalmente em tribunal, a primeira coisa que uma pessoa assediada precisa é que a defendam, fui alvo de assédio e nunca cedi porque tive sempre colegas ao meu lado e em público a dar a cara, sem tremer e vir com conversas estilo “onde há fumo há fogo, mas ela também”. Não, no meu caso ligam-me e dizem, estou contigo. É o que faço – sempre. Agarro no telefone quando é com eles e digo “estou contigo, onde é que assino”. É isso que é preciso fazer, sempre. O problema não é o corporativismo, é o contrário, é que não há espirito de corpo de classe, há obediência e medo às hierarquias e aos que as servem, os sectores não se defendem nem se unem a debater os seus problemas. Concorrem como animais entre si para ver quem fica com os lugares, as quotas.
Em vez dos media andarem a ouvir Ministros que têm páginas para comunicar porque não fazem este trabalho de casa, de informação publica, independente do Estado e dos governos? A discrepância entre as notas em aula e em exame e o que esses professores sofrem (têm piores horários? processos disciplinares?).
Este país tem 300 anos de inquisição, é uma chaga. A perseguição aos hereges é a norma.
Disse-lhe para falar com os sindicatos mas disse-lhe a verdade, ainda hoje se aguarda um congresso sindical, precedido de plenários em todas as escolas, para se debater isto: que educação está-se a dar nas escolas? Que pedagogia? Que currículos? Que notas? Afinal o que andam andamos) os professores a fazer? É isso que é preciso debater. Com urgência.
Nós fizemos um estava o Antonio Carlos Cortez Letras a Elisa Costa Pinto Roberto Della Santa João Jaime Pires e a Sandra Duarte e para aí uns 40 professores. São 140 mil. É preciso inverter esta despolitização, esta ausência de participação. Juntar, participar, ouvir, debater, fazer plenários educativos em escolas, e depois um grande encontro nacional, sem isso todos serão alvo de assédio. Ou morrem de cobardia, o que ainda é pior.