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Escolas de portas abertas no verão? Sim, dizem Marçal Grilo e Mª de Lurdes Rodrigues

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Num debate sobre “a equidade no acesso à educação: antes e depois da pandemia”, a ex-ministra da Educação (entre 2005 e 2009) lembrou que existem estabelecimentos de ensino que “não conseguem contrariar a realidade do território” onde se situam, “por maior que seja o investimento feito”.

A reitora do ISCTE alertou para a incapacidade de se conseguir atingir o sucesso académico entre os alunos que frequentam algumas das escolas situadas em “guetos territoriais”, admitindo que deveria ser equacionada a hipótese do seu encerramento e transferência dos estudantes para outros estabelecimentos de ensino.

Maria de Lurdes Rodrigues questionou se faz sentido “insistir na permanência de escolas” onde “nenhum professor quer estar, onde as crianças e as famílias ficam fechadas nos mesmos guetos territoriais em que já habitam e a escola não consegue cumprir a sua missão”.

A reitora reconheceu que não existe uma “solução fácil” para combater o insucesso e por isso deve ser repensada a atual rede de escolas, que tem o mérito de garantir o acesso universal ao ensino.

Mas não basta o acesso, é preciso atingir o sucesso escolar: “Fui ministra da Educação há quase 20 anos e quando olho para trás questiono se algumas escolas não deveriam ter sido simplesmente encerradas, transferindo-se toda a comunidade escolar para territórios mais qualificados”, disse durante o debate promovido pela Edulog, que hoje lançou uma plataforma digital que agrega indicadores na área do ensino em Portugal.

Algumas escolas “não conseguem, por maior que seja o investimento e a defesa dos princípios da igualdade de oportunidades, contrariar as desigualdades que estão na base dos territórios em que se inserem”, alertou.

Recentemente, também o subdiretor-geral da Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência (DGEEC), Pedro Abrantes, sublinhou que as escolas com maior concentração de alunos desfavorecidos têm mais dificuldades em conseguir atingir o sucesso: “Os alunos beneficiam em conseguir estar em escolas mais heterogéneas”, disse num encontro com jornalistas.

Maria de Lurdes Rodrigues lembrou hoje que este é um problema “que todos os países enfrentam” e que deveria ser alvo de análise por instituições e peritos.

“Como se protege as instituições de ensino para que possam cabalmente cumprir a sua missão nos territórios mais difíceis? É qualificando-as e permanecendo e insistindo neste paradigma da organização de uma rede para facilitar o acesso indiferente ao sucesso ou é necessário reequacionar o paradigma das redes e combinar redes que não permitam apenas a acessibilidade mas que garantam o sucesso educativo a um maior número de estudantes”, questionou.

A ex-ministra sublinhou que o tempo dos alunos na escola não se coaduna com o tempo necessário para uma intervenção nestes territórios, que permitam reduzir as desigualdades.

“A urgência da educação é uma urgência que já está em atraso e não é compatível com andar a reboque de políticas de território. A política de educação tem de ser de tal forma robusta, que consiga afirmar os princípios de acesso e sucesso”, disse.

A reitora do ISCTE-IUL voltou hoje a defender que as escolas deveriam permanecer de portas abertas durante o verão para receber os alunos e compensar “o tempo perdido” durante o confinamento.

“Há crianças, jovens e estudantes que correm sérios riscos de ficar para trás ou de serem perdidos em resultado dos efeitos da pandemia. Tem de haver um cuidado muito especial com as aprendizagens”, defendeu, sublinhando que o projeto de verão deveria incluir “todos os jovens”, sem ser preciso “afetar a vida dos professores”.

Também o ex-ministro Eduardo Marçal Grilo disse estar “completamente de acordo com um verão de portas abertas”, mas defendeu que o Governo terá “de abrir os cordões à bolsa” para compensar os professores que permaneçam nas escolas durante esse período.

Tal como aconteceu com o pessoal médico, o atual presidente do Conselho Geral da Universidade de Aveiro entende que também aos professores “não se pode pedir, sem exigir uma compensação”.

Os dois ex-ministros foram unânimes em considerar que os alunos pertencentes a grupos mais frágeis voltaram a ser mais atingidos durante a pandemia.

“A equidade no acesso à educação: antes e depois da pandemia” foi o tema do debate promovido pelo Edulog, da Fundação Belmiro de Azevedo, que hoje lançou a plataforma digital Edustat – Observatório da Educação.

A plataforma agrega indicadores e produz informação quantitativa sobre educação, com base em dados de entidades nacionais – como a Direção Geral das Estatísticas de Educação e Ciência ou o INE – mas também com dados internacionais, como os da OCDE.

O trabalho disponível na plataforma foi realizado por uma equipa de 25 investigadores que fizeram o levantamento de dados, desenharam novos indicadores e exploram a informação que existe, explicou Daniel Carvalho, secretário-geral da Edulog.

O ministro Tiago Brandão Rodrigues saudou o projeto e lembrou o tempo em que “as estatísticas da educação se resumiam a um pequeno conjunto de números” e as discussões se baseavam em perceções e experiências de cada um.

Sublinhando a importância da divulgação e cruzamento de dados e novos indicadores estatísticos, o ministro lembrou que “têm de ser interpretados com muita prudência, humildade, muita cultura, muita ciência, muita sensibilidade e muita empatia para se entender o que querem dizer”.

O ministro sublinhou que “valorizar uns dados em vez de outros ou até umas interpretações em vez de outras, implicam sempre um conjunto de premissas, valores, de convicções que devemos assumir e aceitar que não são únicas. Senão é a própria democracia que acaba por se ressentir alimentando a ilusão numa certa tecnocracia como a falácia do populismo”.

Sapo