Terminado o ano letivo mais difícil de sempre, que avaliação faz?
Faço uma avaliação claramente positiva do trabalho que fizeram escolas, docentes, diretores, todos os que trabalham nas escolas, as autarquias e também as famílias, que tiveram um papel preponderante. O que aconteceu não teve aviso prévio, tivemos de reagir com muita celeridade. Num fim de semana, fechámos o sistema educativo e lançámos um conjunto de orientações para as escolas. Foi muito importante para a contenção do surto epidemiológico o fecho das escolas, que não implicam apenas aqueles que lá estudam e trabalham. Permitiu que a sociedade pudesse readaptar-se para começar o confinamento. Mas é muito importante dizer que nem um só dia deixámos de ter escola. Pudemos dar a resposta curricular e pedagógica, obviamente que com mais dificuldades naquelas semanas.
A verdade é que as escolas arrancaram a velocidades muito diferentes.
Na sociedade em geral houve instituições que reagiram mais rapidamente, houve pessoas que se adaptaram melhor. E houve seguramente poucos sectores que responderam de forma tão positiva, e saudada por todos — interna e internacionalmente —, como o sistema educativo. Eu disse naquele primeiro dia que não podíamos deixar ninguém para trás. Existem escolas em meios onde é mais difícil dar essa resposta, mas foram-se adaptando para a poder dar.
Mas admite que o ensino à distância evidenciou as desigualdades preexistentes e houve alunos a ficar mesmo mais para trás do que outros?
A existência de desigualdades é um facto, e eu próprio disse que se agudizam numa situação como esta. Era impossível que fosse de outra forma. As desigualdades são um dos maiores desafios contemporâneos. Tivemos alguns paladinos a dizer que tudo tinha sido um fracasso, que as escolas e os professores tinham falhado e que até as próprias famílias tinham falhado. Mas o fracasso verdadeiro era se o sistema educativo não tivesse dado resposta, e isso não aconteceu. Dizer isso é demagógico, paternalista, precipitado e até contraproducente, porque este surto não acabou. E, sobretudo, é injusto para a dedicação, resiliência e até criatividade que demonstraram todos os atores da educação.
Olhando para trás, teria feito algo de forma diferente?
Todos poderíamos ter feito coisas de forma diferente. Mas não tenho nenhuma dúvida de que o sistema educativo deu uma resposta capaz, importante e impressiva ao desafio com que fomos confrontados.
Não se arrepende de não ter permitido nem que fosse só um mês de aulas presenciais para os alunos do básico? Outros países começaram por aí.
Primeiro é preciso colocar as comparações internacionais dentro das fases de surto epidemiológico de cada país. Depois é preciso dizer que Portugal fez algumas opções e as coisas correram globalmente bem. Foi no dia 9 de abril, na altura da Páscoa, quando o confinamento era tão estrito que nenhum de nós podia sequer sair do seu município, que decidimos o que fazer no futuro, dando alguma previsibilidade às famílias. Encontrámos soluções para dar resposta através da televisão e do ensino à distância. Mantivemos as avaliações — houve partidos como o BE que, a certo momento, quis terminar com todo o processo avaliativo, com as consequências que isso teria — e conseguimos manter as redes de proximidade. E decidimos que os alunos do 11º e do 12º anos iriam voltar. A decisão teve de ser tomada numa altura em que ainda não sabíamos com certeza se iríamos poder sair de casa durante este ano letivo. Por outro lado, optámos logo por estender o ano letivo.
Mas porquê optar pelos alunos do 11º e do 12º anos?
Porque têm mais autonomia, têm uma rede de escolas que está mais bem apetrechada e capacitada para ter algum distanciamento físico, porque as dificuldades de aprendizagem nesses casos já nunca poderiam ser recuperadas. E havia uma maior pressão por causa dos exames, e nesses anos a taxa de abandono e retenção é muito mais crítica.
Mas são os mais novos que precisam de maior contacto com os professores e que não conseguem aprender sozinhos à distância.
Não podemos reagir agora como se não tivesse havido um surto epidemiológico e uma situação de saúde pública como a que tivemos. Os mesmos atores que em determinado momento nos disseram que era importante ter uma calendarização para que as famílias se adaptassem e soubessem o que fazer iam mudando (de opinião) ao sabor não dos números ou de estudos sérios, mas, acima de tudo, das suas vontades e da dificuldade que muitas famílias tiveram em estar com as crianças em casa. Para nós foi importante haver previsibilidade, manter a ligação das escolas às famílias e às crianças e manter o papel social da escola, com a oferta de 30 mil refeições diárias e o apoio às crianças beneficiárias da Ação Social Escolar.
Não era mais justo não alterar as notas atribuídas no segundo período?
É fundamental dar esse retorno do ensino. Sem a avaliação a funcionar, muito dificilmente manteríamos essa aprendizagem.