Que medidas deveria implementar o Ministério da Educação, no imediato, para combater a falta de professores?
O SIPE, em 2018 apresentou ao ME 12 medidas para combater a falta de professores, medidas essas para serem concretizadas a curto, médio e longo prazo. Relativamente às medidas de caráter imediato, salientamos as ajudas de custo e de deslocações, os horários dos docentes contratados serem completados de forma a que tenham um vencimento minimamente digno com os respetivos descontos para a segurança social, o fim da precariedade e prolongar as colocações dos docentes até 31 de agosto. As propostas do SIPE não foram acolhidas pelo ministério.
Há desinvestimento na escola pública? Quando começou?
Sim, há um grande desinvestimento na Escola Pública essencialmente a partir 2007 através das políticas educativas implementadas pela antiga ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues. Depois, para agravar veio a troika e, neste momento, que temos um governo com superavit orçamental, nada mudou. As políticas continuam economicistas refletindo-se na falta de professores, na procura de jovens para esta profissão e no abandono de milhares de docentes profissionalizados.
O Governo tem dito várias vezes que os problemas da escola pública têm décadas. O que foi falhando ao longo dos anos e porque não há soluções?
O problema pode ter décadas, mas este Governo está praticamente há uma década a governar e não houve investimento consistente nas escolas, quer em instalações, equipamentos, telecomunicações, quer em recursos humanos, docentes, e não docentes.
Nas manifestações, os professores pedem “respeito”. Esse pedido é apenas direcionado ao Governo?
É direcionado ao Governo. Se o Governo tivesse implementado políticas de valorização e dignificação da carreira docente e do professor enquanto agente de educação, demonstrava o seu respeito por estes profissionais e não seriam necessárias manifestações.
A descredibilização e o “trato” do Governo em relação à profissão docente transmitem à população em geral que os professores e educadores são profissionais bem remunerados e privilegiados. Mas os atuais acontecimentos fizeram com que a maioria da sociedade percebesse que a realidade é muito diferente.
Na pandemia, os educadores e professores multiplicaram-se, desdobraram-se e fizeram muitos sacrifícios pessoais e financeiros (aumento da internet, aquisição de computadores, câmaras, telemóveis, etc) e entraram literalmente pela casa dos seus alunos, abrindo e expondo também a sua casa, para não prejudicar os seus alunos e por amor à profissão. Hoje em dia, com a falta de professores para exercer a profissão, a sociedade em geral já percebeu que a docência não é assim tão atrativa.
O que tem a dizer aos pais que estão contra as greves?
A greve é o último recurso. É um grito de desespero, pois os dias de vencimento perdidos fazem muita falta a quem ganha tão pouco, num país onde a inflação não para. Além disso, a greve é um direito constitucionalmente garantido com o 25 de Abril. Acresce que o exercício do direito à greve também é uma lição de cidadania, resiliência e justiça. Compreendemos que uma greve possa causar incómodo aos pais, mas muito pior será o facto de os alunos não terem aulas, não por causa de greves pontuais, mas sim pela falta de professores profissionalizados durante um ano inteiro.
A falta de professores levou a uma revisão dos requisitos para a docência. Concorda com as alterações?
Concordamos com os estágios remunerados. Não concordamos é com o facto de ser necessário diminuir os requisitos científicos e pedagógicos para se ser professor, baixando a qualidade do ensino, para se fazerem “professores à pressa”, quando as reformas deveriam ser estruturadas.
Há professores impedidos de aceitar horários por terem sido penalizados por erros de concurso. Esta medida, prevista na lei, faz sentido numa altura em que há tantos alunos sem aulas?
Temos sido confrontados com casos verdadeiramente dramáticos e até desumanos, nomeadamente por não dominarem as plataformas e não aceitarem as colocações inadvertidamente e, a verdade é que estes professores, profissionalizados, fazem muita falta nas escolas, pois temos ainda muitos alunos sem professores.
Há cada vez mais alunos estrangeiros nas escolas portuguesas. Há condições para acolher esses estudantes?
O Ministério da Educação precisa de colocar mais professores para dar apoio a estes alunos de modo a facilitar a integração dos mesmos na sala de aula e na escola.
Tem esperança de que, nas novas negociações já anunciadas pelo ministro da Educação, haja um passo em frente por parte do ME no que se refere ao descongelamento do tempo de serviço e a outras reivindicações?
Sem esperança não há luta e nós não vamos desistir. Acontece que, neste momento é conhecida, em relação à recuperação do tempo de serviço, a posição do Presidente da República, dos partidos políticos incluindo o maior partido da oposição e da sociedade em geral (sustentada por dezenas de inquéritos à população). Consideramos ainda que, neste momento, estão reunidas todas as condições necessárias para que, faseadamente, nos seja contabilizado todo o tempo de serviço, aliás como já se procedeu nas Regiões Autónomas da Madeira e do Açores. Portugal não está dividido em três Países!
Relativamente a outras reivindicações, tais como o fim das quotas, e o fim do regime probatório, regime especial de aposentação, horários de trabalho, regime de mobilidade por doença, vencimentos condignos que acompanhem a inflação, ajudas de custo e deslocação, ultrapassagens, agressão ao professor ser considerado crime público, consideramos que além de justas são necessárias para “valorizar quem está e atrair quem vem”. Com a resolução destas reivindicações o Ministério da Educação criaria condições para que os 12 mil docentes que abandonaram a profissão, regressassem. Salientamos que as propostas do SIPE são sensatas, ponderadas e justas!
Medidas enviadas ao ministro da Educação
Em 2018, o SIPE apresentou várias medidas ao ME para combater a falta de professores, entre elas estão a atribuição de casa e subsídio de deslocação para professores deslocados; a alteração aos horários de contratação (os horários deverão ser completos para atrair mais docentes); a alteração da lei em casos de agressão a professores, passando a ser considerado um crime público; a valorização da carreira docente (melhores vencimentos, abolição das cotas e vagas na progressão na carreira, recuperação do tempo de serviço, reduções pela idade concedida na componente individual de trabalho); a captação dos 12 000 professores especializados que abandonaram a carreira; a aposentação, sem penalizações, para os docentes com 36 anos de serviço, independentemente da idade (libertando assim lugares de quadro para as novas gerações de docentes), entre outras.