No final de novembro, em todo o mundo, ainda havia 23 países com as escolas fechadas e cerca de 220 milhões de alunosc continuama ser afetados por essa decisão. África e América do Sul são as regiões mais afetadas, como alerta uma equipa de investigadores num estudo ainda em pré-publicação, onde criticam o processo “caótico” da reabertura das escolas a nível global e o impacto “desproporcionado” que está a ter nas crianças e jovens. “É preciso um esforço global e coordenado para que, urgentemente, as crianças voltem à escola”, defendem.
Numa fase inicial da pandemia, quando ainda não se conheciam os riscos que a covid-19 poderia trazer para as crianças, o encerramento das escolas foi uma das medidas de contenção aplicadas em quase todo o mundo. Segundo a UNESCO, no final de março, cerca de 1,5 mil milhões de alunos em 169 países (84% do total) foram afetados pelo fecho das escolas. “O regresso à escola foi muito variável de país para país e é ainda um problema controverso e por resolver”, concluem os autores, entre os quais está Alasdair Munro, investigador em doenças infeciosas pediátricas no Hospital Universitário de Southampton, no Reino Unido.
O problema é que as escolas foram abrindo nos países mais ricos da América do Norte e Europa, enquanto que em muitos países na América do Sul e África, onde as desigualdades já são mais acentuadas, ainda se mantêm fechadas. E o problema está em parte no impacto que poderá ter no abandono escolar. A UNICEF estima que só na América do Sul cerca de 3,1 milhões de alunos possam desistir da escola.
EFEITOS PARA O RESTO DA VIDA
Segundo os autores, a decisão de manter estes estabelecimentos encerrados deve-se a um receio “desproporcionado” do papel que as crianças possam ter na transmissão do vírus. Vários estudos científicos publicados nos últimos meses têm reafirmado que a abertura das escolas não está associada a uma subida do número de casos e que as crianças não são supertransmissoras.
De facto, os países onde as escolas ainda não reabriram nem são os mais afetados pela pandemia, olhando para o número de mortes. “A Europa e África mostram os dois lados deste espectro. Apesar de África ter tido uma taxa de mortalidade relativamente baixa, a maioria dos países ainda tem as escolas fechadas. Apenas sete (Benin, Burkina Faso, Cabo Verde, Chade, República do Congo, Guiné Equatorial e Serra Leoa) num total de 24 países, na África Central e Ocidental, é que já reabriram as escolas depois dos confinamentos gerais”, conclui o artigo.
Manter os alunos longe das escolas apenas contribui para “aprofundar as desigualdades sociais, económicas ou de saúde entre os países mais ricos e mais pobres”. E isso está a “exacerbar as desigualdades enraizadas em cada país, afetando de forma desproporcionada as crianças e as famílias que já são os mais vulneráveis”.
Apesar de muitos países na Europa terem as escolas em funcionamento, como é o caso de Portugal, Espanha, França ou Alemanha, há estratégias distintas. “Por exemplo, em Itália, as escolas nas zonas vermelhas [com maior risco de infeção] foram encerradas e os alunos ficaram com ensino à distância”, refere o estudo. “Apesar de os dados apontarem para uma transmissão baixa do vírus nas escolas italianas, sobretudo entre os alunos mais novos, muitos estabelecimentos são encerrados com frequência com receio de terem maiores surtos.”
Segundo os autores, há muito pouca evidência de que o encerramento das escolas tenha sequer trazido benefícios no controlo da pandemia. “Pelo contrário, esta decisão põe as crianças e os jovens num elevado risco em termos sociais, económicos e de saúde perante o futuro, desencadeando consequências graves durante o resto das suas vidas.”