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“A larga maioria da educação do nosso país é medíocre” Raquel Varela

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Culpabilizar os rankings pelo mau estado da educação ou apontar que revelam desigualdades é o mesmo que ir ao médico e zangar-se com o termómetro que nos diz a temperatura. Os rankings são um medidor, um dos, de uma doença sistémica. Sou contra exames, porque eles obstaculizam uma educação de qualidade. O que porém os rankings revelam é que a mais pura realidade, na minha óptica. A larga maioria da educação do nosso país é medíocre – a média ou é negativa ou está no limitar. Isto nas públicas e nas privadas – sim, não vale a pena pagar.

Salvam-se no meio deste panorama uma dúzia de escolas, todas privadas, muito boas, não mais de uma dúzia, onde curiosamente se manteve uma estrutura de ensino clássica. Em quase todas as escolas por esse país fora há inovadoras “pedagogias de competências” e os professores quase têm que dançar nas aulas, por um salário mau e precário muitas vezes. Nas outras – nas poucas escolas excelentes -, há ensino, ou seja, conhecimento científico. E os professores são bem pagos e reconhecidos.

Podemos continuar a negar esta evidência falando do “esforço” brutal de todos. O esforço existe, de facto, mas é suor e cansaço por um caminho errado, que não nos leva a lado nenhum. Estamos sem mapa, ou seja, sem uma estratégia educativa para a maioria da população, votada à mediocridade sempre a coberto de grandes “inovações” “autonomia” “flexibilidade” pedagógica, e outros vazios retóricos que se acumulam à medida que tudo piora, e fica evidente aos olhos de cada um.

O resto da temperatura dos rankings já sabíamos. Bairros mais pobres, educação mais pobre; pais médios, educação média. Isto é, a escola não cumpre qualquer papel em combater a desigualdade e serve não o conhecimento mas um mercado de trabalho pobre e mal qualificado. São os resultados medíocres de e para um mercado de trabalho medíocre. Desse ponto de vista a escola cumpre o seu papel e os Governos não se enganaram – a escola cria uma sociedade de trabalhadores pouco ou mediamente qualificados, sem domínio do conhecimento fundamental, que servem um país atrasado, que não produz nada fundamentalmente e vive de turismo e exportações cuja cadeia valor está fora do território, nos países centrais. O panorama é desolador. Mas este é o resultado esperado de um país que tem mais resorts turísticos do que boas escolas.

Quem governou nos últimos 40 anos fez escolhas, e elas estão aí. Somos excelentes na gastronomia, muito bons no turismo, e muito maus na educação. Podem sempre dizera-me que na natureza humana só uma pequena percentagem é excelente. Respondo-vos que isso é falso – quando mudamos os ambientes a larga maioria é excelente. Podem também dizer-me que a culpa é do vizinho do lado. Mas eu não acredito que possam os pais culpar os professores; os professores culpar os pais; os professores do superior culpar os da primária; e os da primária recordarem que foram formados no superior. Tudo isto é uma boa de neve que cresce cada vez mais, enquanto rola montanha abaixo. Quanto pior é a educação no primário, pior será no superior. Quanto pior é no superior pior será no secundário. Quanto piores forem os professores, piores serão as crianças. Quanto piores forem os pais piores ficarão as crianças, que um dia também serão pais e professores. É a bolsa de neve.

Ou começamos a encarar o ensino a sério, e a pagar muito bem no sector da educação, em todos os anos de ensino, considerando que queremos ser um país excelente nesse campo ou, lamento, só vai piorar – um dia a bola rebenta lá em baixo e descobrimos que a casa não tem fundações e o telhado, excelente, caiu em cima de todos – ninguém se salva bem num país com estar estratégia de praia, sol, e rendas fixas de gestores.

Fonte: FB Raquel Varela