As primeiras semanas do mês de março de 2020 foram uma verdadeira montanha-russa de novas informações e desinformações, atualizações do estado da COVID-19 em Portugal e principalmente de muitas inseguranças. A meio da segunda semana as Escolas esperavam a qualquer momento uma decisão do Governo relativa à suspensão das atividades letivas presenciais e, apesar de muitas escolas terem tomado a decisão de fechar as suas instalações ainda antes da decisão governamental, a ordem de encerramento chegou no dia 16 de março. A verdade é que já ninguém se sentia seguro dentro das escolas: nem os pais, nem tão pouco os professores e restantes funcionários. E assim, a duas semanas das interrupções letivas da Páscoa, as escolas, os professores e os alunos, e as famílias que agora se viam obrigadas a estar em casa, muitas em teletrabalho, foram obrigados a reagir e a adaptarem todas as suas rotinas às exigências desta nova realidade.
A maior parte dos professores desdobrou-se, numa corrida contra o tempo, na procura constante das melhores práticas educativas e na melhor maneira de chegar aos seus alunos. Os professores foram forçados a reinventarem-se – o verbo que melhor e mais caracteriza o contexto em que vivemos de momento! -, a aprenderem, a inovarem, a atualizarem-se. Foram mais do que nunca entregues à sua capacidade de serem autónomos e criativos nas suas práticas. De uma maneira flexível, os professores puderam tirar “da cartola” a inovação, o talento e o mérito que têm para desenvolverem os seus projetos educativos. E esta autonomia e flexibilidade têm sido, no meio de todas as dificuldades que os assoberbam neste momento, uma mais-valia para os professores dentro deste cenário de ensino à distância.
Na construção diária de um “mundo novo”, é fundamental assegurar que não voltamos ao ponto em que nos encontrávamos inicialmente porque, se assim for, todo este esforço (dos professores, das estruturas escolares, dos encarregados de educação, e dos alunos) terá sido em vão. É fundamental que se aproveite aquilo que tem sido feito de bom durante este tempo estranho de aulas à distância. É fundamental que se criem, por um lado, estruturas básicas por parte das escolas para uma possível evolução tecnológica sustentável quando regressarmos fisicamente às escolas e, por outro lado, é fundamental que se repense um sistema pedagógico híbrido, que complemente a escola num espaço online e a escola presencial, valorizando as vantagens dos dois.
É necessário que, num regresso a um “mundo novo”, se aproveite o incrível capital de empreendedorismo e criatividade que os professores têm vindo a demonstrar durante estes tempos desafiantes, num redefinir do conceito de “Autonomia Escolar”. Porém, não se pode descurar a importância de um contacto presencial entre alunos e entre alunos e professores, para que nunca ousem tentar substituí-lo por uma webcam. É preciso ter sempre presente que a Educação é um processo social e que, como seres sociais que somos, é através da socialização, do contacto direto e da exploração do corpo no espaço e com os outros, que crianças e adultos partilham experiências, saberes e conhecimentos, ideias e interesses, que desenvolvem competências sociais e emocionais, e que constroem a sua identidade e sentido de pertença. E isso nunca vai poder ser substituído por um ensino à distância. É urgente, na construção de um “mundo novo”, do mundo de agora, saber lidar com o sedentarismo, com a inatividade física, a obesidade infantil e consequentes possíveis doenças físicas e mentais inerentes.
O mundo novo é também o agora e o hoje. O “mundo novo” somos nós que o construímos todos os dias. E é preciso que os professores e educadores não se esqueçam que, no momento em que escolheram esta profissão, escolheram a missão de colocarem uma “capa” às costas e desenvolverem um trabalho comprometido de servir a criança/aluno. Escolheram um trabalho comprometido numa igualdade de atenção para com todas as crianças e jovens, por atitudes de respeito, de valorização e de aprendizagem contínua, constante e em interação. Escolheram a missão de desenvolverem um trabalho flexível o suficiente para agir numa conjuntura de imprevisibilidade, com capacidade de interagir e intervir, mobilizando-se nos mais diversos contextos e situações. Escolheram a missão de apostar na centralização do aluno, atendendo permanente a todos os sinais que indiquem mudança e progressão e estando sensíveis às características e potencialidades de cada um. Escolheram deliberada e conscientemente a missão de plantar a semente da curiosidade, da criatividade, do conhecimento, do sentido crítico, da empatia, da integridade e da esperança.
Todo o esforço colocado nestas últimas semanas, tudo o que foi construído, todo o caminho palmilhado e refletido não podem ser deitados a perder na construção diária deste “mundo novo.” O “mundo novo” é o hoje e o agora. E agora, os professores e as escolas têm, a missão de aproveitar a inovação que têm experienciado neste caminho diferente para continuarem a construção e reflexão educativa da Escola de Hoje.