A palavra Escola deriva do termo grego Scholé, significando tempo de lazer ou lugar de ócio. Pergunto: Qual é o espaço e o tempo da Escola?
Assisto na escola à ditadura da fragmentação do tempo cronológico: aos primeiros cinquenta minutos do primeiro bloco letivo seguem-se-lhe outros tantos, cirurgicamente compartimentados por entre pavilhões de aulas segundo o ritmo de uma velocidade enfurecida e envelhecida. Almeja-se uma educação holística, integral, com um ensino cronometrado e disciplinar. Não será a “ocupação plena dos tempos letivos na escola” uma necessidade de apropriação e de controlo do tempo? Não deveriam os alunos propor sistematicamente projetos para dinamizar? Haverá tempo fora deste tempo cronológico? Como recuperar o tempo processual da construção, criação e intervenção, segundo o “elogio da lentidão” (Milan Kundera) ou da fruição?
O professor encontra-se refém de instrumentos, tarefas e reuniões demasiado burocráticas. E, à medida que os níveis de escolaridade vão aumentando, vai decrescendo a sua autonomia, porque as metas que convergem na lógica dos resultados dos exames nacionais vão-se aproximando e vão-no afunilando. É possível autonomizar o aluno, quer dizer, promover uma educação que desenvolva o pensamento crítico e criativo e, simultaneamente, heteronomizar a ação do professor?
Um dos meus projetos, uma das minhas “pequenas utopias”, designa-se “Filosofia com Cinema”, e assume a cumplicidade vital e essencial entre a filosofia e o cinema, potenciando o desenvolvimento do pensar, do sentir, do imaginar e do agir. Trata-se de um projeto plural que começa na Escola Secundária de Amarante, ESA (Clube Filocinema, Plano Nacional de Cinema, disciplina de Filosofia e, sempre que possível, na “disciplina interdisciplinar” de Literacia, Comunicação e Pensamento que congrega as áreas de Português, Filosofia e Inglês) e se prolonga para fora da ESA com a “Filosofia com Cinema para Crianças” no ensino do primeiro ciclo (EB nº 2 de Amarante), e com os ”cineséniores” da Casa da Boavista, residência sénior, mas também com o estabelecimento de parcerias com outras associações/instituições.
Interessa-me muito que cada um descubra, através da pedagogia da pergunta, a obra fílmica, mas que paulatinamente se vá descobrindo, de uma forma partilhada e humanizada. Por isso, apraz-me levar os alunos do ensino secundário ao primeiro ciclo e ambos à residência sénior, porque erigem-se enquanto agentes de transformação, de resolução de problemas, isto é, de aperfeiçoamento de si, dos/com os outros, da comunidade.
Confesso que um dos méritos do Global Teacher Prize Portugal foi o de me colocar em diálogo com excelentes professores, de norte a sul do país. Por isso, cresceu-me a pequena utopia de um “Erasmus nacional” que potencie o estreitamento de laços e o estabelecimento de parcerias entre escolas, com a mobilidade de professores e de alunos portugueses em território nacional.
E nesta utopia de uma escola simultaneamente no sítio e fora do sítio, desejo que os saberes, as artes e os professores dialoguem entre si sem hierarquias e preconceitos. Em prol de uma Educação onde professores e alunos são construtores e realizadores de pequenas utopias.
Professora de Filosofia na Escola Secundária de Amarante. Vencedora do Global Teacher Prize Portugal 2021
‘Caderno de Apontamentos’ é uma coluna que discute temas relacionados com a Educação, através de um autor convidado.