Início Editorial Sobre o desprestígio da classe: os pontos nos ii – Alberto Veronesi

Sobre o desprestígio da classe: os pontos nos ii – Alberto Veronesi

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Depois de todas as previsões das autoridades sanitárias, nacionais e internacionais, apontarem para que a situação epidémica comece a normalizar-se apenas no princípio de 2021, o Ministério da Educação (ME), finalmente, falou de setembro. Já não era sem tempo! Mal seria, ao menos, que não olhasse para o próximo ano letivo, usando o modelo a que nos habituou: contar sempre com quem costuma desprezar, misturar a ideia de um e a ideia de outro, não citar, e apresentar, com pompa e circunstância, um documento com as típicas Orientações.

E que disse o ministro da Educação? Que seria para continuar em sistema misto, isto é, ensino presencial e remoto. Ora aqui importa colocar os pontos nos ii.

Não podemos aceitar mais esta tentativa de desprestígio da classe. Se o que fizemos antes nos dignificou, se aceitarmos agora estaremos a desprestigiarmo-nos. Fui, desde do início, defensor do fecho das escolas. Posteriormente defendi o terminus do ano letivo. Depois coloquei-me contra a abertura, mesmo que só para o secundário, pelo que defendi este sistema de ensino remoto, atendendo à situação extraordinária, sem sequer entender algumas queixas de colegas, relativas ao uso abusivo, por parte do ME, dos nossos meios tecnológicos, do nosso serviço de internet, aos horários totalmente “loucos” e outras tantas queixas, mas não entendi porque quis acreditar que a situação a isso obrigava e que seria transitória pois quem de direito estaria a acautelar o reinício em setembro.

Só que me enganei. Senti, portanto, a necessidade de alertar para o facto de ser urgente começar a planear setembro, quando ainda se discutia se se testavam ou não os professores, para a reabertura a 18 de maio.

O ministro da Educação mostrou esta semana manter uma certa agrura para com os professores, quando disse que vai processar disciplinarmente os que inflacionarem as notas, partindo do princípio que a desonestidade impera dentro da classe, e piorou quando acrescentou que o próximo ano letivo servirá para atestar as aprendizagens destes últimos meses, subentendendo-se das suas palavras que talvez os professores não tenham conseguido!

Talvez sem noção do que acabara de dizer, acrescentou que o ensino será misto e rapidamente nos apercebemos que estamos perante alguém sem lucidez suficiente para fazer frente aos tempos difíceis que se adivinham.

Não conheço ninguém, mesmo aceitando que possa haver, que aprecie a forma como este ministro tem gerido a pasta da Educação e creio que isto trará consequências já em setembro.

A forma como se prevê que querem resolver a situação, fazendo com que os professores continuem a trabalhar a triplicar, fazendo presencial e remoto, sem intenções de contratar mais professores, apenas fazendo a gestão eficiente dos recursos, sem intenção de munir todos os professores, através de subsídios, de material tecnológico para a prática do ensino remoto, parece-me o princípio do seu fim!

Ao invés poderia o ME, tendo em conta as desigualdades sociais, bem visíveis através do número de alunos sem acesso à internet e sem equipamentos informáticos, reforçar o orçamento às escolas públicas para que possam adquirir equipamentos para emprestar aos alunos. No mesmo sentido, é preciso pensar nos professores, no reforço do Estado à aquisição ou empréstimo de equipamentos tecnológicos (sem esquecer a necessidade de um novo Plano Tecnológico para a Educação e para os Recursos Educativos Digitais) para desenvolverem o ensino online a partir da casa de cada um. Neste tempo de emergência, os responsáveis governamentais e as autarquias devem ter a preocupação de pensar nos professores, nos alunos e nas famílias, nas suas angústias e dificuldades, criando respostas eficientes para minimizar as desigualdades.

O apelo que faço, não é só aos professores, é a toda a sociedade, aos pais que não aceitem qualquer coisinha oferecida pela escola estatal, aos professores que não aceitem que uma situação extraordinária onde todos demos o nosso melhor, ultrapassando todos os limites de direitos laborais, se torne permanente sem que sequer nos incluam na equação das soluções.

Escrevi em tempos que poderíamos aproveitar a atual situação e torná-la numa janela de oportunidade, mas prevejo que o atual Governo verá apenas uma janela de oportunidade para, mais uma vez, poupar na Educação!

Tenho pena, mas espero que não aceitemos!