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O Governo fez bem em dar prioridade ao Secundário e aos exames?

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SIM. O Governo faz bem em planear a forma e o momento em que, se as autoridades de saúde o aconselharem, alunos, professores e pessoal não docente possam voltar às escolas. Talvez não a 4 de maio, mas quando for possível.

A saúde está primeiro do que o trabalho e as aulas, mas não duvido que, mais tarde ou mais cedo, as medidas de confinamento serão levantadas, pelo menos parte delas.

Chegará o dia em que, de forma faseada, as pessoas voltarão ao trabalho e conviverão, reavivando a economia e a sociedade. A escola não deve ficar à margem deste regresso progressivo à normalidade; deve, lentamente, reavivar como se voltasse de umas férias grandes.

Poderá colocar-se a questão de saber se ainda haverá tempo e condições, este ano letivo, para reabrir as escolas e retomarem-se as aulas, mesmo que apenas para alguns alunos, como estabeleceu o Governo. A resposta parece-me simples: se, do ponto dos especialistas em saúde pública, não existirem contraindicações, não vejo porque não se há de retomar, mesmo que falte apenas uma semana para o final do ano letivo. A questão que pode ser colocada é a oposta: porque não o fariam se a saúde pública não o contraindica?

Não podemos frustrar os alunos que vão precisar de exames para o Ensino Superior

Parece-me bem que, a haver condições para o início progressivo das aulas presenciais, sejam os alunos do secundário, os que têm exames, os primeiros a avançar, pois, neste momento, os esforços das escolas devem concentrar-se nestes alunos.

Estivéssemos nós em setembro, a melhor opção talvez fosse a de chamar primeiro as crianças dos primeiros anos de escolaridade, mas estamos a dois meses do final do ano escolar e não podemos frustrar as expectativas dos alunos que vão precisar de exames para aceder ao Ensino Superior.

O plano do Governo prevê que regressem às escolas apenas os alunos que realizam exames de equivalência à frequência ou em disciplinas para acesso ao Ensino Superior. É uma opção prudente mas não isenta de contestação, quer por aqueles que se opõem a qualquer abertura das escolas quer porque dela decorrem alterações das regras de conclusão do secundário, com implicações na seriação dos alunos no acesso ao Ensino Superior. Seja qual for a opção, defendo que a atividade escolar presencial deve iniciar-se, ainda que gradualmente, no momento em que for seguro.

Presidente do Conselho das Escolas – José Eduardo Lemos


NÃO.

Decididamente, os exames não são o objetivo primeiro da escola, são antes um instrumento indispensável para disciplinar e guiar a aprendizagem dos alunos e monitorizar a eficácia da escola. O Governo surpreende: depois de cinco anos a demonizar os exames, escolhe agora os exames do secundário (e as férias) como objetivos primeiros e únicos da saída do confinamento.

A grande maioria dos professores tem feito um enorme esforço de conversão para o ensino à distância, com muitas horas de trabalho invisível. Mesmo para jovens adultos (no Ensino Superior), o ensino à distância tem progredido lentamente em todo o mundo, sendo preferido o modo misto, porque a componente presencial da aprendizagem é importante para lá do natural desenvolvimento da personalidade. Para as crianças e os mais jovens, ninguém recomenda a passagem total à distância. Para estes, a improvisação em curso levará a uma utilíssima terapia ocupacional ou, numa visão negativa, a uma simples terapia homeopática.

Nas próximas semanas, vamos certamente incorporar-nos na onda europeia de saída do confinamento, porque o perigo de escalada exponencial do surto está muito atenuado (pelo menos temporariamente) e a economia não aguentaria muito mais. Estamos a caminho de uma cura mais mortífera do que a doença.

Temos de estar preparados para a eventualidade de o próximo ano escolar ser tanto ou mais afetado do que este

A vida nas escolas não será como dantes, mas alunos, professores e funcionários adaptar-se-ão rapidamente. As férias poderão ser encurtadas ou adiadas. Sim, o problema não fica resolvido com exames mais apressados e teleavaliações para aqueles que se prestem ao telecontacto ou decisões administrativas para os outros. Temos de estar preparados para a eventualidade de o próximo ano escolar ser tanto ou mais afetado do que este e garantir que não perdemos estas gerações. A vida dentro das escolas vai mudar, mas não podemos fingir que o problema termina nos Santos Populares.

O acesso ao Superior é importante para alunos e famílias. (O Governo vê o enorme problema político que pode explodir-lhe nas mãos!) Nenhum país renunciou ao seu sistema de acesso, e temos de fazer os exames terminais. Ajustando as datas e os formatos, tudo indica que isso será possível sem renunciar a uma preparação presencial mínima de seis semanas para todos os alunos. Mas não esqueçamos as outras crianças e jovens. E os seus pais.

Professor universitário e ex-secretário de Estado do Ensino Superior entre 2013 e 2015 – José Ferreira Gomes

Fonte: Expresso