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E se as escolas voltam a fechar? As lições a tirar do ano que passou

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Há um cenário preferencial para o próximo ano letivo, unânime entre professores e Governo: que os alunos de todos os anos de escolaridades regressem às aulas presenciais. O que deverá acontecer entre 14 e 17 de setembro. Aplicar regime misto ou não presencial apenas “se as autoridades de saúde nos disserem que é preciso fazê-lo num determinado território ou em todo o país”, disse o ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues, em entrevista ao Expresso. No entanto, professores e diretores alertam: há que não repetir alguns erros do passado na hora de regressar a casa.

As histórias repetem-se. Um aluno de um jardim-de-infância da Figueira da Foz testou, na terça-feira, positivo para a covid-19, obrigando ao isolamento de outras 28 crianças e quatro funcionários da instituição. No início de julho, um surto registado na Fábrica de Lacados Abrelac e na Escola Básica n.º 2 de Paços de Ferreira levou ao encerramento deste estabelecimento de ensino de forma preventiva, para limpeza e desinfeção. Em Vizela, um ATL fechou portas depois de confirmada a infeção de uma funcionária. Os relatos de escolas encerradas fazem adivinhar que o próximo ano letivo será remado consoante a maré.

Faltam apenas dois meses para o arranque escolar e as autoridades de saúde nacionais e internacionais alertam que a pandemia está longe de conhecer um fim. A Direção-Geral da Saúde coloca mesmo em cima da mesa a possibilidade de um pico de infeções em outubro, mudança de estação, altura em que as fragilidades na saúde dos cidadãos se tornam mais visíveis. Por isso, “temos de estar preparados para o pior”, alerta o ministro da Educação. O pior seria voltar a fechar as escolas, por força de um surto, e acionar novamente o ensino à distância.

Cumprir a promessa da universalização do acesso a computadores e internet “é essencial” para um ensino à distância mais sereno, diz ANDAEP

Mas repetir uma escola à distância significa ter em conta as fragilidades de milhares de famílias: aquelas sem um computador ou sem um computador a mais para os filhos, bem como aquelas que não têm capacidade para ficar em casa a garantir o apoio aos mesmos. O Governo prometeu acionar um programa de universalização do acesso a equipamento e internet para todos os alunos já no próximo ano letivo e cumprir a promessa “é essencial” para um ensino à distância mais sereno, diz Filinto Lima, dirigente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP). Embora admita não ser suficiente. Há outras situações a ter em consideração no regresso do ensino à distância para professores e alunos.

Mudar a forma de avaliar

Assim que os portões das escolas encerraram, em março, os professores viram-se obrigados a repensar a forma de ensinar, mas a grande dúvida manteve-se sobre a forma mais justa de avaliar os alunos – com recursos e contextos tão diversos. A grande maioria dos docentes trocou os testes por apresentações, pela valorização da assiduidade e do esforço que cada aluno provava. Uma medida que os diretores e professores se apressaram a dizer ser um passo no caminho certo e que já deveria ser a realidade educativa em Portugal.

No entanto, nem todos os professores foram capazes de garantir avaliações inovadoras, à medida do ensino à distância, o que gerou várias críticas por parte de pais. Por isso, Filinto Lima, da ANDAEP, alerta que o modelo de avaliação deve ser repensado “seriamente” se os alunos tiverem de regressar a casa. “Acho que é importante definir os critérios de avaliação como se definiu para o 3.º período e diminuir a ponderação dos testes de avaliação. Porque fazer uma avaliação à distância, à partida, será sempre diferente”, alerta. Os testes escritos, por exemplo, “podem ser feitos pelos pais ou com outras ajudas, sem que o saibamos”.

Na opinião de Paula Carqueja, dirigente da Associação Nacional de Professores (ANP), “será muito mais importante termos uma avaliação permanente dos nossos alunos do que estar a julgá-los por um teste”, não só em tempos de pandemia, mas de forma contínua. Já em entrevista ao DN em junho, lembrava que “quando há um teste estão vários fatores associados a todo o momento e à resposta, o que prejudica toda a avaliação e aprendizagem que um aluno tem vindo a fazer”. “Há uma desmotivação geral quando um aluno teve um trabalho excelente – no qual se esforçou, para investigar e ser criativo, tudo o que se pede agora [no mercado de trabalho] – e depois falha num teste de memorização, de atenção”, explicava.

Quanto aos exames nacionais, por outro lado, Paula Carqueja é perentória: “devem continuar a existir”. A representante dos professores frisa que, ao contrário dos testes escritos realizados durante o ano letivo, “o exame não funciona como uma percentagem superior” a todos os restantes critérios envolvidos na avaliação final de um aluno, “é simplesmente mais uma prova” e “continua a ser um instrumento de equidade nacional”.

Ainda assim, é apologista de que a realização dos exames nacionais deva prosseguir “nos moldes em que ocorreram neste ano”, em que os estudantes fazem apenas os exames que necessitam para concorrer aos seus cursos na faculdade.

Menos trabalhos de casa

Passavam poucos dias desde que todos os alunos foram obrigados a trocar a sala de aula por uma secretária (às vezes, improvisada) nas suas próprias casas, já os pais diziam estar perto de um ataque de nervos com a quantidade de trabalho que recaía sobre os filhos e, inevitavelmente, sobre eles.

Com a distância, vários professores aceleraram o ritmo dos alunos, pedindo diversos trabalhos que deveriam ir sendo apresentados além das aulas síncronas. Os diretores reconheceram, na altura, ter havido “um exagero” por parte de alguns docentes.

Mas o erro não deverá ser para repetir, diz Filinto Lima, da ANDAEP. Não só a avaliação deve ser repensada, mais “também deverá existir maior cuidado em relação tarefas que os professores entregam aos seus alunos”, reforça, alertando para o desafio que o ensino à distância acarretou para várias famílias, divididos entre a vida profissional e a vida escolar dos filhos. “Talvez envolver menos os pais durante o momento em que estamos em casa, poupando-os para outras tarefas. Claro que os pais são parte essencial, sobretudo ao nível do 1.º ciclo, mas a tentativa deve ser de procurar não os deixar como apoio constante aos alunos”, remata.

DN